Inicialmente, achamos importante
compartilhar uma impressão pessoal quanto ao concurso e o ingresso nesta rede.
“Quando li o edital para este
concurso, fiquei feliz e me senti esperançosa em relação ao espaço que a
Educação estava ganhando em São Bernardo. Dedicação exclusiva, com um salário
razoável que eu ganharia para trabalhar dignamente com os meus alunos, podendo,
literalmente, me dedicar a eles, planejando, pesquisando e organizando os
documentos necessários para balizar o desenvolvimento e propor novas
estratégias de ensino mediante às situações observadas. Alguns colegas torceram
o nariz: “mas como é que vou dobrar período?!”. Na minha cabeça, com tantas
leituras sobre educação, tanta discussão, eu tinha claro o seguinte: a ideia
não é acumular; a ideia é fazer o melhor, dedicar o melhor do seu tempo
produtivo para fazer aquele grupo de 25 ou 30 crianças avançar. Porém, quando
ingressei na rede, me senti enganada. Além de planejar para a minha classe,
tive que planejar para o Programa de Apoio à Aprendizagem, com um grupo super
difícil, sob uma proposta extremamente desgastante, para o Grupo de Estudos,
para a minha classe – que por ser heterogênea, eu propunha atividades
diferenciadas para possibilitar que todos os alunos avançassem – e,
eventualmente (no meu caso, pois estava com PAA), substituir. Quando, em
reunião pedagógica, apontei as dificuldades que encontrava, a OP disparou a
frase que, pra mim, soou como desumana, como que vindo de uma pessoa que nunca
trabalhou, leu ou sequer ouviu falar sobre o que é uma sala de aula: “mas você
tem 2h de HTPL e mais 2h de planejamento para o PAA. Dá pra
planejar, é só você se organizar”. A partir daquele momento, juntando tudo o
que eu já tinha vivido na rede durante aqueles poucos meses, desacreditei
totalmente que esta Secretaria deseja de fato oferecer Educação de qualidade as
suas crianças.”
Agora, vamos aos problemas:
A rede insiste, por meio do senhor Fernando Mendes, dizer que só
cumprirá a “Lei do 1/3” quando puder oferecer este “benefício” a todos os
professores, de qualquer carga horária. Entendemos que o cumprimento desta Lei
é importante para todos os docentes, porém, a Lei fala especificamente sobre os
professores de 40h. Além disso, querendo ser “justa” com os demais colegas, a
rede se posiciona de modo “injusto” conosco, uma vez que o colega de 30h, por
exemplo, pode fazer o planejamento para apenas uma classe, ainda que seja em
sua casa. Quando este “dobra período”, ele ganha pelas duas classes que assume.
Nós de 40h, não temos tanto tempo assim pra planejar em casa, uma vez que nos
dedicamos 35h aos alunos da rede. Além disso, somos obrigados a fazer vários
planejamentos (da nossa classe, PAA, Grupo de Estudo, substituições e Professor
Parceiro) e ganhar por um só, porque não chega nem a ser o salário de um
professor de 30h mais ½. Nossa estimada Secretária Cleuza Repulho, a qual
respeitamos, já parou para pensar sobre esta situação? É de seu conhecimento
que essas coisas têm acontecido em sua rede? Qual é a sua sincera opinião
quanto a isso?
No ano passado, quando aconteciam as substituições fora da escola,
colegas eram deslocados de suas escolas para substituírem em outras bem
distantes da sua. Sabemos de muitos casos de professores que estavam na região
da Paulicéa, por exemplo, que precisaram ir para o Planalto, Jardim Calux,
tendo que tomar 2 ônibus, além dos quais já havia tomado para chegar a sua
escola. Quando alguns questionaram, foram AMEAÇADOS por pessoas da Movimentação
quanto ao Estágio Probatório. A Secretaria tem conhecimento de que não
recebemos nem a passagem para chegarmos em nossas escolas? Por acaso vocês têm
noção do que é assumir a sua própria classe sem pique nem estrutura física e/ou
psicológica, porque o professor estava vivendo uma “aventura” com outros
alunos, de outros lugares, gastando do seu bolso, inclusive para comer? Existe
entre as pessoas que trabalham nesta Secretaria (no setor de Movimentação, por
exemplo) alguém que seja humano o bastante para compreender que o professor
“reclama” porque é uma situação extremamente desgastante e absurda, e não
porque ele é um preguiçoso e não pensa nos alunos? Até por que, quem vocês
pensam que enganam, quando dizem que o professor de 40h é obrigado a substituir
no contraturno, “a bem do aluno”, já que ele só assumirá a classe para
contê-los dentro de uma sala, para que os pais não procurem a imprensa pra
dizer que o filho foi dispensado? O trabalho pedagógico com aquelas crianças
naquele dia – e dos alunos daquele professor, pois este tem a sua própria
classe – está seguramente perdido.
Antes do nosso concurso, a rede oferecia o PAA aos professores que
quisessem ampliar a jornada. Muitos se interessavam, tanto pela proposta quanto
pela possibilidade de ganhar um pouco mais, às vezes, por uma necessidade
pontual. Porém, a rede preferiu OBRIGAR professores que não querem assumir tal
projeto, pois, assim, não deveriam pagar a mais por isso. E os alunos? E os
professores da própria rede – alguns até tiveram formação específica – que já
contavam com a possibilidade de aumentar a renda? Percebem quantas pessoas
foram prejudicadas por esta determinação mesquinha?
É do conhecimento da Secretaria que as diretoras já estão se organizando
para começar o PAA, os Grupos de Estudos e as Parcerias após o Carnaval?
Há também os professores da EJA que, por serem de 40h, são discriminados
em suas UEs. Os professores que são apenas da EJA têm direito à “horas de
projeto”, nas quais eles podem planejar as suas atividades. Porém, como essas
horas devem ser cumpridas das 18h às 19h, os professores de 40h não têm direito
a elas, já que este é o seu horário de “janta”, uma vez que devem ficar “à
disposição do Ensino Fundamental”, empurrados para o PAA, Professor Parceiro,
substituições e Grupos de Estudo. A Secretaria não entende que está sendo
INJUSTA com esses professores? Eles planejarão tudo isso a que horas? Nas suas
manhãs? Em 2h de HTPL?
Nas escolas, os professores de 40h são empurrados para fazer de tudo um
pouco, como servir café, pintar parede, separar materiais, auxiliar alunos de
inclusão... Isso, para nós, é assédio moral, uma vez que a equipe gestora das
escolas não está nos pedindo um favor, está nos MANDANDO fazer coisas, já que
estamos À TOA, sem alunos. Para nós, isso também se configura como desvio de
função, mas a Secretaria nos responde, dizendo que estas são “FUNÇÕES
CORRELATAS AO CARGO”. Quem aí na Secretaria já foi professor? Vocês acham mesmo
que nós ficamos à toa quando estamos sem alunos. Lamento, mas em nossa formação
aprendemos que não devemos preparar relatórios, fazer planejamentos, corrigir
atividades dentro da sala de aula, junto com os nossos alunos. Eles merecem a
nossa total atenção, ou não? Além disso, não nos formamos para entrar na sala e
improvisar a aula daquele dia. Vocês sabiam que muitos de nós fazemos isso?
Pois é, temos vida fora da escola. A dedicação exclusiva, que é algo que
apreciamos, é de apenas 40h e não de 168h, como alguns daí da Secretaria
gostariam.
Outra coisa, vocês pagam estagiários e auxiliares de educação para
trabalharem com inclusão. Por que nós, que temos nossa classe, somos OBRIGADOS
a acompanhar as inclusões no contraturno?
Ficamos nas escolas, às vezes até por 14h seguidas (em dias de HTPC) e,
além de não ganharmos o suficiente para nos alimentarmos adequadamente
(vale-alimentação em torno de R$ 90), não temos nem água gelada, ou ao menos
fresca, para beber. Quando propomos às nossas diretoras que os professores
façam um rateio para comprar um bebedouro (que nem deveria vir de nós), elas
nos respondem “é proibido ter bebedouros nas escolas”. Vocês sabiam que elas
nos respondem isso? Somos obrigados a abrir uma torneira de uma pia suja, que
as crianças já cuspiram e lavaram ferimentos, para encher uma garrafinha com
água quente? É assim na secretaria também?
A rede gasta uma fortuna para oferecer cursos – que, aliás, são muito
bons –, todos fora do horário de serviço. Mas esses cursos só irão contribuir
para o enriquecimento da nossa prática em sala de aula; logo, por que temos que
dispor do nosso tempo livre, com as nossas famílias, nossas coisas, nossos
hobbies, para fazermos uma formação que interessa mais à Secretaria, que ficará
com todo mérito, do que a nós, que nem uma gratificação por eles receberemos?
Além disso, teremos que gastar com passagem e alimentação do nosso bolso. Quando
questionamos o senhor Fernando Mendes sobre a nossa situação específica de 40h,
novamente ele respondeu que, se os de 40h puderem fazer cursos dentro das 10h
que, por Lei seria de formação, todos os outros também teriam esse direito e,
já que não dá pra todos, não dá pra nenhum. Também queremos que todos os
colegas possam ter direito a isso, é bom pra Educação de São Bernardo, não é
favor para o professor; mas, insistimos, é justo, então, sobrecarregar o
professor de 40h? A Secretaria sabe que, entre os colegas da rede, fomos
apelidados de “os faxineiros da educação”? É lógico que não desmerecemos a
função do pessoal de apoio, pelo contrário, eles merecem muito mais respeito de
todos nós, mas no edital do concurso não dizia que seríamos “faz-tudo” ou “quebra-galho”.
É muita desvalorização. Além disso, cabe ressaltar que o período de 1/3 não é
só para formação, mas para o planejamento das atividades, a elaboração de
relatórios e correção de avaliações e atividades.
As professoras substitutas, enfim, não assumiram salas este ano. Porém,
elas ficam “à toa” em laboratórios de Informática, enquanto os professores de
40h, que assumiram classe, fazem Professor Parceiro e auxiliam alunos com
dificuldade e de inclusão. O que a Secretaria pensa a respeito? Vocês querem
ser justos, certo? Estão mesmo sendo justos conosco?
Achamos louvável a iniciativa de discutir democraticamente como a rede
de São Bernardo implementará o 1/3 de carga horária sem aluno. Porém,
entendemos que isto não pode ser um pretexto para permanecer USANDO (sim, nos
sentimos USADOS) os professores de 40h para fazerem de tudo na escola enquanto
se discute a implementação. Queremos que, de imediato, a Secretaria envie uma
rede às escolas, comunicando aos diretores que não assumiremos PAA, nem
Parceria, nem Grupo de Estudo, sendo que, somente numa necessidade extrema
(quando a professora substituta já estiver substituindo e não houver outra
substituta disponível em escolas da região – pois essa é a função delas),
faremos alguma substituição – o que deve ser indispensavelmente eventual.
Vocês estão recebendo um grupo de professores neste concurso que é muito
bom. A rede de São Bernardo do Campo tem tudo para ser uma rede de referência
na Educação. Mas os professores estão desgastados, desmotivados e
desvalorizados. E não é só por causa de salário não. Muita coisa pode
ser resolvida já, mesmo sem colocar a mão no bolso. Todos os professores, os
quais temos conhecimento, pensam em sair da rede e ir pra redes “melhores”.
Vocês acham normal uma rede ter um número tão elevado de exonerações? E vocês
acham que podem oferecer uma Educação de qualidade com tanta rotatividade?
Poderíamos assinar esta carta, apresentando uma grande lista com nomes
de professores e as respectivas escolas nas quais trabalham, mas, infelizmente,
a prática da perseguição é muito presente nas UEs deste município. Vocês sabiam
disso?
Entendemos que, por ser uma Lei que está em vigor desde 2009 (e o vosso
concurso para professores de 40h teve o edital divulgado em 2010), poderíamos
exigir o cumprimento da mesma. Mas estamos apelando para o bom senso e para a
ratificação de um compromisso que vocês assumiram com a sociedade, ao se
colocarem à frente da Secretaria de Educação. Pedimos esperançosos, que vocês
possam refletir sobre essas questões e, de forma imediata, nos abster da
obrigação de ficarmos com tantos alunos, em situações tão distintas, por tantas
horas no dia. Pensem que boas condições de trabalho também refletem em melhores
índices que medem a qualidade da Educação brasileira.
Certos da compreensão e do compromisso com a classe do Magistério
Municipal.
Atenciosamente,
professores 40 horas